Saturday, October 31, 2009

A DESOCULTAÇÃO DA FACE

A “face oculta” é com toda a probabilidade o que na faculdade chamávamos uma “cara de cú”. E porque nenhuma “cara de cú” produz outra coisa, dali vai sair trampa. Num território especializado em tal produção, isso mesmo haveria de ser o escopo de todas as tentativas de salvação do país, do estado, da economia e o instrumento fundamental da demanda colectiva da felicidade nestas terras e por estas gentes. Se aqui apenas há trampa, é isso que falta vender. Exportar. Reínventar. Examinar exaustivamente (mas eficazmente). Um país que cheira a esgoto de Tavira a Caminha, devia centrar nas esterqueiras, lixeiras, como na produção de todos os resíduos e dejectos, por mais tóxicos e infecciosos que se revelem, as mais desveladas atenções. Sócrates tentou fazê-lo e produziu o Freeport. Sem saber exactamente o que fazia quis ainda engendrar-se a si mesmo e isso o fez com uma "licenciatura independente", outorgada num Domingo. Lixo, claro. Mas acaso pode isso estar errado? Acaso há aqui mais que lixo? Estas coisas devem ser tratadas desapaixonadamente. Gente de merda há-de valer pela merda que é. Não adianta ficcionar-lhes outro valor. E a última coisa que se deve fazer é pedir-lhes, ou consentir-lhes, qualquer aparência de normalidade. Eles valem pela anomalia. E na merda que são revelam-se preciosos. São preciosos para Psico-Sociologia. Para a Sociologia. Para a Literatura. Para a Psicologia. Para a Antropologia. Para a Ciência Política. Para a Sociologia Política. O facto de isto ser um país de merda, conduzido por gente de merda, pode ser um belíssimo negócio. Um grande buraco em todas as teorias gerais, tem valor em si mesmo. O grande problema é que só as pessoas normais poderiam gerir tal valor. E era precisa alguma franqueza por parte dos anómalos, i.e. da gente de merda. Eles têm de desistir da sua pretensa normalidade, da sua pretendida construção de imagem de distinção, da sua ânsia de ser outra coisa. Também isso é matéria de estudo plausível, claro. Mas não se lhes deve consentir que isso atinja qualquer eficácia na dissimulação. Um desgraçado do Diário de Notícias entende que no caso Casa Pia – imagine-se - emergiu “uma nova geração de magistrados”. Loucura. Ali apenas há uma fracção quase inócua do processo necessário, que levou a juízo nem meia dúzia de tarados de entre os quinhentos nomes identificados pela CIA. E isso sempre seria (evidentemente) um nojo. O semelhante gera o semelhante. Uma terra de merda tem necessariamente uma judicatura de merda, uma polícia de merda, produzindo processos de merda (com a ocultação de quase tudo o que havia a debater). Uma terra assim tem também um governo de merda e uma administração pública de merda. Um ensino de merda. Com a consistência necessariamente correspondente de tudo o mais. Tudo isto, aliás, distinguível a olho nú. O que é preciso portanto é – como sempre – transformar as fraquezas em forças. No caso, é preciso transformar a merda num grande negócio. E a via é a editorial, naturalmente. Universitária, plausivelmente, ainda que deva ser em universidades doutro lado, mas logo aqui ao lado há um grande país em cujas universidades isso pode assentar. É preciso evitar, todavia, que esta merda de gente se ponha a pensar-se, convidando-a a manter aquilo de que sempre gostou: a solução de uma gente inteligente a pensá-la. Porque se eles se põem a pensar dá nisto que o idiota do D.N. ilustra aqui perfeitamente: um messianismo de merda. Na circunstância, um messianismo assente numa judicatura de merda. “Entre os corpos da nação em ruínas” (como dizia o manifesto do 28 de Maio) eles continuam à procura da instituição onde resida (substancialmente) a representação natural e a legitimidade moral do golpe de estado (independentemente da forma que venha a assumir). Ora, ora… Isso é compreensível, mas desinteressante e evitável. O que mais nos faltava agora eram reflexões de merda, de outro "cara de cú”.

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