O ano de 2010 ficou marcado pelo
suicídio da estupidez. Mas o caracter suicidário da estupidez não é uma novidade. Assim foi, em todo o caso. A estupidez matou-se várias vezes ao longo do ano. Desde o despenhamento de Lech Kaczynski e dos noventa
dignitários polacos, ao caso WikiLeaks. Desde a falência do Estado da
Califórnia à crise Grega. E a crise global vem sublinhando a estupidez – também
ela letal - da alienação de inúmeros vectores da produção industrial nos
processos de deslocalização que privilegiaram a Ásia e agora revelam, em toda a
amplitude, a derrota estratégica como factura das medíocres vitórias tácticas
visadas. Na tugária, recorda-se o único momento de reflexão pessoal de José
Sócrates - que ninguém notou no seu terrível significado – quando este dizia,
coitado, que os dirigentes políticos acentuadamente marcados pela erudição
literária são latino-americanos e não europeus. Uma Europa entregue às
bestas, portanto, como se sabia. No testemunho de uma besta, segundo tudo
indica. E uma América Latina que reflecte seja no combate político que a
atravessa, seja quanto ao futuro que pretende, guiando-se, evidentemente, pelas
Humanidades. Como toda a gente que tem de debater tais coisas, aliás. As questões
fundamentais, realmente, estão nos sistemas de convicções que condicionam todas
as decisões. Além dos impulsos imediatamente animais, não estamos a ver domínio
onde seja possível querer sem crer. (Digam o que disserem os pretensos
engenheiros tugas da pretensa independente tuga). À escala global, o execrando
Ratzinger continua às voltas com a sua porno estrutura, alegadamente
eclesiástica. Em torno da teologia moral do preservativo. Tratando da
beatificação de Voitila, grande protector do Padre Maciel e canonizador de
genocidas. Multiplica os dislates. Mas vem sendo menos mal sucedido na vertente
financeira da coisa. Porque continua a evitar pagar o que deve em sede
indemnizatória. E o banco daquilo continua a fazer lavagens de dinheiro e,
portanto, a desempenhar importante papel nas acções de sombra (cobertas pelas
razões de estados tão pouco razoáveis) onde se libertam fundos (sem controlo
estatal) para as mais estranhas operações (sem controlo parlamentar). Por algum
motivo no Afeganistão sob precária ocupação militar da OTAN se multiplica a
produção e comercialização do ópio. No plano da tugária o ano correu na
costumada compilação – sempre desinteressante - de ignomínias e abandonos.
Podemos destacar o asqueroso servilismo de Santos Ferreira do BCP, oferecendo à
CIA a sua radical falta de qualquer verticalidade (na qual a CIA nenhum
interesse viu), por via de uma perspectiva de negócios com o Irão que não
chegou a concretizar-se. O Amado dos Negócios Estrangeiros revelou-se também o
que toda a gente da sua laia não consegue deixar de ser: um sopeiro. E porque o
semelhante gera o semelhante, os pseudântropoi nem como fiascos revelam
interesse. Na campanha eleitoral para as presidenciais destaca-se o execrando Cavaco
– veneranda figura de arrepiante parolo, tão característica da chamada “política
portuguesa” – mas desta vez a criatura não reivindica a sua importância na
construção da “Califórnia da Europa” de que tanto se orgulhava há cinco anos.
Aqui está a tugária. Califórnia da Europa, realmente. Mas nem sequer europeia
pela mentalidade, ou o Cavaco não poderia, tão simplesmente, existir desta
forma. E por todo o lado – aqui também - o pretenso anonimato das grandes titularidades dos grandes interesses financeiros claudica na evidência das identidades dos indivíduos responsáveis pelos vários descalabros. E na, política como nas finanças, tudo
se revela estar, afinal, a níveis excessivamente domésticos, excessivamente
primários, excessivamente claros. Esta clareza é a grande aquisição da época. E
será plausivelmente determinante na evolução próxima. Na tugária tudo será como
sempre foi. Quando tudo depender da multidão em (justificada) fúria, ninguém
haverá que coloque a multidão na dependência da palavra lúcida. Porque,
justamente, a presença da literatura e das humanidades é nula. Na antecâmara
das novas guilhotinas um tribunal popular dirá, desta vez com acerto, que a
república não precisa de cavacos. O outro dissera com radical desacerto que a
república não precisa de sábios. A república precisa de sábios, sim. Mas aqui
só conseguimos ver labregos ostentando togas e becas usurpadas. Como Cavaco. E
os cavacos travestidos de gente ajuizada realmente não fazem - e nunca fizeram -
falta nenhuma. O mundo teria sido bem melhor sem eles.
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