Thursday, December 6, 2007

O PAÍS DA CASA PIA

O juiz Rui Teixeira vem dizer – no essencial - que sem o arbítrio solto, antes possível, já não pode haver investigação criminal eficaz. Também na PJ o “inspector médio” pensa mais ou menos o mesmo, ainda que em gradações diversas –“como é que se pode saber a verdade sem dar umas latadas nos gajos, não é?” Rui Teixeira acha, segundo parece, que as alterações do Processo Penal se fizeram para proteger o crime. É talvez dramatizar. A generalidade das instituições, segundo a experiência comum do autóctone médio, servem bastantes vezes para proteger e cultivar aquilo que devem prevenir e perseguir. E fazem-no com estas alterações ao Código de Processo Penal ou sem elas, porque o problema é social e não tanto técnico-jurídico. Entretanto José Maria Martins vai na terceira ou quarta condenação (na pendência do processo Casa Pia) por alegados excessos verbais no desempenho da sua defesa, entre as quais se conta ter chamado "porco" por três vezes a Serra Lopes. A possibilidade de se processar e condenar um advogado em jurisdições paralelas (a Ordem e outros Tribunais Criminais) na pendência do seu desempenho de uma defesa e antes do processo onde advoga terminar, a possibilidade de publicar essas condenações, sem qualquer menção do contexto ao qual se reportam os factos, isso traduz solução única na Europa. (Não é possível com esta facilidade em mais parte nenhuma). E podendo embora achar-se estranho que um advogado chame porco a outro (em audiência?) não deixa de ser estranho que um advogado se sinta impelido a fazê-lo (se o tiver feito). Não pode esquecer-se que, no âmbito do Processo Casa Pia, a porcaria, como se sabe, é a substância e o modo das coisas. Tais condenações de José Maria Martins não ajudam, em nada, à honorabilidade do três vezes chamado porco. E geram até compreensível simpatia por José Maria Martins. Sobretudo porque a Lei Portuguesa pune a resposta verbal sob o efeito da cólera perante provocação injusta (ao contrário das outras leis criminais da Europa), como pune o insulto que responde a outro. Como toda a gente bem vê, isto é intolerável pelo simples e evidente motivo de traduzir constrangimento, pela força da Lei Penal, à conduta de poltrão. Um homem deve calar-se diante de um insulto e apresentar queixa (para ficar em processo uns anos). Não pode ripostar com uma qualquer fórmula decapante e esquecer a coisa, porque lhe fazem a ele um processo crime... Devíamos ver quantos processos desses entopem os tribunais. E indagar dos motivos pelos quais a "inteligência" legislativa, como a "inteligência" do aplicador da Lei são tão avessas ao padrão habitual da virilidade de conduta, ao ponto de o punir obsessivamente e sem transigências (não há suspensões de processo, nem, em regra, suspensões de pena nestes "crimes" que boa parte das vezes o não são, segundo o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem). Este horror diante dos habituais padrões de virilidade é uma decorrência - bastante lógica- dos critérios doentios e demais padrões do país da Casa Pia. Tudo isto é completamente alheio às reacções normais de um homem normal.

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