Sunday, October 25, 2009

CONFISSÃO POR VENTURA: O PAPISMO E SARAMAGO

O papismo autóctone reage ao Caim de Saramago, dizendo-lhe, pela boca de Fernando Ventura (o exegeta oficial do sítio), que o escritor não soube ler o texto (cuja versão viciada o próprio papismo afirmou canónica). Essa versão não corresponde ao sentido real do texto original. Aceita-se a confissão. Mas todos sabíamos já que o papismo vive - e sempre viveu - sobre a falsificação dos textos. Dos sagrados, como dos teológicos. Mesmo Agostinho de Hipona só é entre eles citável até às Retratações. E essa é uma das razões pelas quais o papismo não consente nunca a liberdade de palavra nas suas fileiras. Porque falar exige ali saber, em cada momento, que sentido a hierarquia daquilo dá (imperativamente) às palavras. Gente repulsiva. Estrutura repulsiva. Conduta repulsiva. Mas é bem papista este raciocínio de opor à denúncia o “bocadinho do absoluto” que a erística recomenda, in casu, para calar ou desqualificar o opositor. A coisa traz até o matiz da pretensa sedução intelectual. E é apresentada (pela "imprensa de referência") como se nenhuma réplica fosse possível. A réplica é possível. Confessar, por Ventura, a falsificação da versão a uso tem aqui duas consequências: a primeira é que o papismo ousou impor por norma aquilo que nunca o foi; a segunda é que - ao torpe não pode aproveitar a torpeza própria – lhe fica vedado criticar alguém por os ter tomado a sério onde nenhuma seriedade havia. Mas fica sobretudo um grande problema: é que se o sentido das Escrituras só pode ser desocultado a uma erudição iniciada e previamente autorizada, então nenhum sentido teve jamais qualquer obediência dos outros, seja a que versão for que o papismo alguma vez tenha apresentado. Fica também a nú esta exorbitância do papismo pretender a posição de juiz em matéria onde é réu. E também por isto Saramago tinha de escrever Caim.

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