Monday, July 14, 2008

CIMEIRA DE PARIS: A SÍRIA ROMPE O CERCO

Uma manobra sem nexo nem tino na política externa, onde uma e outra coisa faltam há mais de uma década. Manobra nem sequer vasta, mas bastante bem aproveitada pela Síria, em estado de guerra com Israel desde a segunda metade dos anos 40. A Síria oferece à Turquia a possibilidade de voltar a ter uma palavra no Médio Oriente. E o Presidente Hassad mostra a uma incrédula Europa Ocidental do que é capaz a hieraticidade de um Chefe Árabe, recusando sempre falar outra Língua que não a sua (aliás a mais falada e mais lida do mundo). Só um Nusari seria capaz de governar a Síria na tempestade que para ela representaram estes quinze anos. E ei-lo rompendo o cerco fechado desde o primeiro mandato de Clinton. A cimeira de Sarkozy não pode deixar de fazer sorrir. Sem agenda política e sem norte diplomático, traz à Europa os sorridentes árabes porque traduz, pura e simplesmente, o fiasco da estratégia da exasperação de tensões dos últimos dez anos de política externa americana. Mas falta-lhe qualquer direcção política segura. Qualquer noção de objectivos. A Líbia recusou a participação por questão de princípio. Os outros aceitaram por obediência aos ditames da realpolitik, transigindo com a circunstância de se sentarem à mesma mesa com Israel de cuja delegação ficaram isolados pela utilização do critério alfabético. Os Sírios ficaram ao lado da Turquia. Nada inconveniente. A TV5 informou o mundo que os israelitas procuraram o olhar de Bashar Al-Hassad, sem lograrem que o Chefe Nusari os olhasse sequer de relance. (Com quem pensará esta gente que está a lidar?)… O Al-Ahram lembra que a Turquia, Argélia e Israel representam conjuntamente 60% do Comércio total da EU e cita Mourad Medelci para quem (e em síntese livre, mas com entendimento restritíssimo), “inimigos, inimigos, negócios à parte”. A ida a Paris não compromete ninguém. E - como não deixaria de dizer Henrique de Navarra - Paris vale bem um pequeno incómodo. Na circunstância, o pequeno incómodo foi ter de ver, tão perto, a cara do Chefe do Governo Israelita. Bachar Al-Assad, esse, apresenta a fisionomia de um homem tranquilo. Aparentemente, foi ele quem encheu o vazio político da cimeira e é muito interessante a entrevista que deu ao órgão do PCF antes da partida para Paris. Recebeu há dias Mahmoud Abbass e proferiu umas palavras de circunstância, ele que dá asilo a Khaled Mechaal, com quem Abbass não quis encontrar-se. Sarkozy não tem nenhuma ideia das consequências de abrir caminho à excepcional envergadura diplomática de Bachar Al-Assad. O Rei de Marrocos preferiu não assistir de perto. (Hassan II pensava neste tema com bastante seriedade). O Rei mandou uma carta simpática a Sarkozy e o Príncipe Muley Rachid ao jantar de Domingo. Problemas práticos para a cooperação, um quase nada: despoluição do mediterrâneo. Nada a opor (aliás depois de descarregarem toneladas de urânio empobrecido sobre o Danúbio, os países da NATO bem podem propor-se limpar o que fizeram, se o conseguirem). Navegação do mediterrâneo. Perfeitamente inócuo. Migração ilegal… Nisso já deveriam os dirigentes árabes e turcos pensar duas vezes. (Como certamente farão). Em tudo o mais esta cimeira significa que quem desencadeou a estratégia da exasperação de tensões, ou não aguenta mais a tensão gerada, ou hesita quanto ás forças que lhe restam. É simpático sabê-lo. Agora só têm de pagar o preço. Depois há – como em tudo – as fitas, o folklore e o lixo. Fita, foi a ideia em cujos termos nunca se esteve tão perto de um acordo com os Palestinianos. Qual acordo? Regressam às fronteiras traçadas pela resolução da ONU em 47?... Fitas. Folklore (sem quebra de simpatia) parece ser a abertura da Embaixada Síria em Beirute. Não é propriamente uma simples transigência da Síria, convenhamos, muito embora o Líbano seja produto de simples ficção e conveniência europeia. O lixo foram as declarações de Sócrates que não faz a menor ideia do significado prático da reunião. Ainda bem que Portugal não tem política externa. Ia ser uma desgraça se a tivesse. Parece ter havido também algum sarcasmo. Assim, a Síria declara estar pronta a manter com Israel "relações normais". Nada mais claro. Vejamos agora o que a normalidade possa ser.

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