Sunday, November 7, 2010

A "DIREITA QUE NÃO CONTA"

A direita - tal como resulta dos escritos dos respectivos pensamentos políticos - traduz, como regra, a memória cultivada de uma estratificação social arcaica ou arcaízante, podendo animá-la uma nostalgia da “ordem perdida”(com amplitudes muito diversas de assunção), da “legitimidade proscrita” (em regra nos movimentos monárquicos), da heroicidade (tal como a vêm) militarmente vencida e credora, senão da glória, ao menos da admiração incondicional dos que lhe cultivam as memórias. E nisto repousa a sua capacidade de sedução. Intensa, às vezes. Compreensivelmente. Não é raro que os sistemas de organização social historicamente desaparecidos hajam produzido gente rigorosamente notável nas artes, nas letras, no sentido de justiça - e até na defesa das liberdades tal como as compreenderam -  gente admirável na Ética, na Estética, na Filosofia, na Teologia, gente admirável, até, nas armas, na bravura, na grandeza de alma demonstrada em combate (e na vitória, como na derrota). A direita, na pluralidade das suas posições e deste ponto de vista, invoca a História. Cultiva-a. Usa-a como padrão de juízo e até como fonte de critérios de diagnóstico face às tensões sociais e políticas presentes e bem assim – naturalmente – como fonte de critérios que lhe permitem posicionar-se no momento presente. Confunde, talvez, dir-se-ia, a supratemporalidade dos sábios, dos santos e dos heróis com a supratemporalidade de uma solução de ordem social e sistema político. A primeira é um dado de facto na História da Cultura. A segunda, temos que ver melhor. A resposta é menos rápida do que parece, designadamente porque todas as propostas de sistema politico foram formuladas na Antiguidade Clássica e ainda hoje não há outras. O arcaísmo pode fazer-se novidade num momento qualquer. A direita – nesta pluralidade de posições - formula uma Filosofia da História que a traz, quando há estofo para isso (bem entendido), à Sociologia. Esta direita é dificilmente reconhecível na vida política, à parte dois ou três momentos de crise. Os anos oitenta, por exemplo, trouxeram uns monárquicos pesoalmente muito simpáticos, intelectualmente muito activos e politicamente mais pragmáticos do que seria de esperar, ao Parlamento e ao Governo da tugária. Dificilmente seriam classificados como “direita” pela opinião pública. E todavia eram a única direita atendível na “Aliança Democrática”. Lograram mesmo esbater, sem nunca a eliminarem, a tremenda limitação do papismo como referência de fundo que era inquestionavelmente a sua. O papismo é um travão da direita (desta direita) porque consente a inteligência, mas sob licenciamento casuístico e em contexto de compromisso claro. Mas espanta até que tais monárquicos hajam sido chamados, ouvidos, reconhecidos. Porque a Aliança Democrática era a outra dimensão da direita.

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