Thursday, November 8, 2007

A LEGITIMAÇÃO DA MISÉRIA

Medina Carreira publicou um livrinho escrito por terceiro. (Não vale a compra). Vem no mesmo sentido – e na sequência - de um outro livrinho, o de Joaquim Aguiar. Ambos anunciam a desgraça alegadamente legítima, por inevitável, dizem. Anunciam, como se de novidades tremendas se tratassem, coisas claras desde os anos oitenta (como a crise da segurança social). Acrescentam, como se novidade esmagadora fosse, uma velha ideia: estamos a viver acima das nossas possibilidades. Era o que se dizia antes da União Europeia polvilhar o território com subsídios desviados pelos parasitas do costume. E dizia-se isso para legitimar a redução brutal dos rendimentos do trabalho pela desvalorização da moeda (e uma vez, até, pela apropriação directa do 13º mês) para fazer face à bancarrota iminente. Dizem-nos, em síntese, que a classe média vai ter de perder o que adquiriu (a casa, o carro, as férias, eventualmente algumas refeições e, porventura, a educação dos filhos e a cobertura de saúde, porque não se vê que a classe média tenha obtido mais do que isso, aliás a preços usurários). Acrescentam uma palavra que copiam aos defensores do golpe de Pinochet: “inevitável”. Todavia a única coisa segura de tais livrinhos é a malevolência e ignorância dos seus autores. Joaquim Aguiar comete erros históricos imperdoáveis (trazendo também alguns erros ortográficos por ignorância, em citações e referências de vacuidade hilariante e algumas delas também erradas). Medina Carreira ostenta a incapacidade de pensar. Um e outro manifestam a dura realidade (pessoal) de não acabarem um livro há trinta anos. Imaginando que por vomitarem, sem resposta, umas banalidades de página de jornal podem passar por sábios. Por guias da opinião pública. Numa coisa porém devem ser levados a sério: a esterilidade do sistema prepara-se para devorar a vida das pessoas, depois de ter exaurido não só os recursos do país, mas até a simples possibilidade de os gerar. Isto não significa ausência de hipóteses em alternativa. Significa apenas que esta possibilidade lhes parece a mais fácil. A crise, deste ponto de vista, é gerada pela imbecilidade da direcção política do estado, logo seguida da imbecilidade no debate autorizado sobre ela. Mais realista e exacto foi o presidente do Banco Central Europeu há dois anos: "Portugal não tem deficit, tem corrupção". Uma parte das soluções está portanto ao alcance do confisco judicialmente decretado em processo próprio. As outras soluções dependem - na respectiva visibilidade - de deixar falar quem pensa. Quanto a tudo o mais, três perguntas: porque haveria a gente do sistema de acertar aqui, neste pretenso diagnóstico, se falhou sempre em tudo o mais ? Porque haveriam as criaturas do sistema de apontar orientações críveis, sendo eles próprios a desorientação incarnada? Porque haveríamos de ouvi-los em quanto dizem que sabem, se gritantemente dizem o que não sabem e o que sabem não dizem?

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